Realizada na última quarta-feira (18/05), na Câmara de Vereadores de São João da Barra, a 2ª Conferência Local de Controle Social de SJB, sob o tema Discutindo as Políticas Compensatórias do Complexo do Açu, será lembrada como um marco na constituição de uma esfera pública local qualificada. O evento, promovido pelo Movimento Nossa São João da Barra (MNSJB), contou com a participação de representantes da UENF, IFF, ONGs, sindicatos, associações de classe, movimentos sociais, Câmara e Prefeitura locais e do grupo EBX, que optou por participar somente como ouvinte. A grande ausência da noite foi a CODIN que, apesar de indicada pelo Secretário de Desenvolvimento do Estado como seu representante no evento, anunciou sua ausência alegando problemas de agenda.
O Presidente da Câmara de Vereadores, Gerson Crispim (PMDB), abriu e encerrou o evento colocando a Casa à disposição da população para o debate e o monitoramento das ações compensatórias do Complexo, ao passo que o representante da UENF, Prof. Gustavo Xavier (Pró-Reitor de Extensão), destacou na abertura a necessidade de uma maior colaboração entre o poder público e as universidades locais, além da urgência de se dar condições educacionais para que todos possam usufruir das novas oportunidades.
O debate, conduzido pelo Prof. Hamilton Garcia, Coordenador de Extensão do CCH/UENF e do Projeto Controle Social de Governos Locais, girou em torno da necessidade de ações concretas amplamente discutidas para o enfrentamento dos novos desafios. A participação pessoal da Prefeita Carla Machado nos debates foi fundamental para a Conferência, pois, além de elencar e defender as medidas tomadas em sua gestão, ela se mostrou disposta ao debate com a sociedade civil organizada, abrindo as portas da Prefeitura para a colaboração proposta pelo MNSJB. Nas palavras da Prefeita, "quando se comparte decisões, se reparte responsabilidades".
Por seu turno, Alcimar Ribeiro, Coordenador do MNSJB e Professor da UENF, mostrou que os ganhos da cidade com o empreendimento, após três anos de obras, é controverso, sendo necessário que os programas compensatórios e mitigatórios, quer liderados pela empresa ou pela Prefeitura, sejam mais transparentes e consistentes, passando pelo crivo dos especialistas e da sociedade. Utilizando dados que mostram as oscilações nos índices de emprego líquido no município, entre outros, ele afirmou que as oportunidades não estão se abrindo na proporção propalada, que a média salarial das novas vagas ainda é baixa e que o índice de confiança dos bancos na cidade é reduzido, demonstrando que o dinheiro gerado pelas obras do porto não tem circulado significativamente na cidade.
O Prof. Hélio Gomes Fº, Pró-Reitor de Pesquisa do IFF, salientou a importância de diferenciar-se medidas mitigatórias, utilizadas para reduzir o dano inevitável, como aqueles geralmente associados a problemas como poluição, imigração, etc., de medidas compensatórias, que são aquelas passíveis de reverter a perda inicial e gerar ganhos, como as medidas de investimento em projetos estruturantes e multiplicadores (educação, planejamento, prevenção, etc.). Salientando que Campos não está se preparando para os novos desafios, Hélio alertou que os impactos do empreendimento serão muito significativos em SJB e não devem ser subestimados pelos gestores sob pena de gerar um balanço negativo no médio e logo-prazo. Dentre os problemas que se agravarão, Hélio listou a segurança, o trânsito e o saneamento básico, dando ênfase especial ao lixo.
Já o Prof. Hamilton ressaltou a importância de todos colaborarem em nome do progresso geral, abdicando de ilusórios ganhos exclusivos e se abrindo para o debate franco dos problemas gerados pelo empreendimento. Para tanto, observou ele que é preciso que a sociedade civil se abra para a inovação e a participação, que o poder público se modernize e se profissionalize, recrutando quadros por concurso público, inclusive os da administração escolar, e que as empresas deixem de priorizar o marketing social em detrimento das parcerias efetivas com as organizações que habitam o território. Hamilton ainda observou que as universidade devem ser mais atentas à realidade social pois é ela que, ao cabo, determina o destino das pesquisas científicas.
Diversos membros da sociedade civil se manifestaram no debate. O Prof. da FDC, Juliano Rangel, lamentou a mudez da EBX e reivindicou o acesso da sociedade organizada aos termos dos projetos e convênios entre empresas e prefeitura, enquanto Sérgio Soares, dirigente do setor hoteleiro, lamentou a decadência do turismo local em função da especulação imobiliária, da falta de mão de obra capacitada e de incentivos para a perenização do comércio, que ainda funciona sob a lógica da temporada. Dentro da mesma lógica, a empresária Beatriz Soares criticou os gestores públicos pela falta de políticas para o desenvolvimento, em especial o do setor de negócios local.
Vocalizando os interesses dos trabalhadores, o portuário Willis França reivindicou que os efluentes tratados sejam despejados em emissários oceânicos e que seja descartada a hipótese de qualquer despejo na Lagoa de Iquipari que, além, da beleza, é refúgio de espécies marinhas exploradas artesanalmente na região. Aproveitando o gancho, William, liderança da comunidade pesqueira, saudou o deslanchamento do entreposto pesqueiro ansiado há tempos, mas destacou que os problemas dos pescadores artesanais do município não se reduzem a ele.
Falando pelos proprietários rurais, o Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Getúlio Alvarenga, reivindicou a inclusão do pequeno produtor rural nos planos compensatórios, sendo secundado pelo Prof. da UFRRJ, Pedro Nilson, que anunciou o lançamento de um programa municipal modelar neste setor. Dona Noêmia emocionou a todos ao contar o modo desumano como a CODIN vem fazendo as desapropriações na região e lamentou que a Prefeitura não se coloque de maneira mais altiva diante das imposições da EBX e do Governo do Estado.
Por fim, a Coordenadora da Incubadora Tecnológica de Empreendimentos Populares da UENF, Nilza Franco, defendeu a participação de todos os setores de SJB no recém-criado Fórum Regional de Debates do Açu, que se propõe a reunir especialistas, gestores, empresários e lideranças sociais, para discutir as medidas em desenvolvimento para enfrentar os desafios que se avizinham.
O encontro foi demonstração cabal de que existe uma sociedade civil ativa e consciente em SJB, ansiosa por espaços qualificados de participação, restando ao poder público transformar suas promessas de diálogo em gestos efetivos de com participação, e às empresas uma ação menos defensiva com a sociedade. Como sintetizou o Prof. Hamilton, "para se alcançar progressos, todos devem fazer seu dever de casa".
A 2ª etapa da Conferência, que deliberará sobre ações concretas à luz dos debates promovidos, será oportunamente anunciada pela Comissão Executiva do MNSJB, tendo sua data prevista para a primeira quinzena de junho.
Marcus Cardoso da Silva(Cientista Social e Bolsista do Projeto Controle Social de Governos Locais)
Não ficou mencionado ou acordado a definição da àrea de impactos diretos. No caso das plataformas o metodo de definição é o alcance das possiveis manchas de óleo.
ResponderExcluirOra, não podemos cair na armadilha de confundir a área diretamente afetada (poluição) com a área de impactos diretos. Existem outros vetores que não o da poluição como infraestrutura de educação, saúde, habitação, transporte, ... etc. No meu entendimento toda esta infraestrutura é sujeita aos impactos diretos e, portanto, qualificadas legalmente para medidas mitigadoras, e neste caso, o empreendedor deve entregar aos governos as obras prontas.
Hamilton, percebeu que devemos definir primeiro as medidas de mitigação: estão relacionadas aos impactos diretos na área diretamente afetada definida em Eia/Rima e ainda na fase de Licença Prévia. Nestes assuntos nada ainda de compensação.
A compensação deverá vir depois de compromissada a mitigação, na fase da LI e como condicionante para a LO.
Parabéns pelo evento.
Paulo Marinho